Grupo liderado por mineiros é referência nacional em pesquisas na agropecuária

Júlia Rodrigues - 11-06-2025
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Estima-se que, entre 2016 e 2023, os estudos desenvolvidos pelo INCT-CA tenham gerado uma economia de R$ 130 milhões ao ano 

No Brasil, o agronegócio tem desempenhado papel fundamental, mantendo a balança comercial positiva ao longo dos anos. Nesse contexto, o avanço em pesquisas na área de Ciência Animal, que buscam a melhoria da qualidade e produtividade dos animais e dos produtos de origem animal, são fundamentais para manter esse patamar.  Em Minas Gerais, o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Ciência Animal (INCT-CA), sediado na cidade de Viçosa, na Zona da Mata mineira, destaca-se por pesquisas que vão desde a criação de sistemas nutricionais focados no contexto brasileiro, à redução da emissão de poluentes na atmosfera integrando o uso de recursos de inteligência artificial

Escolhido como um dos Projetos Inspiradores homenageados no ano de aniversário de 40 anos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), o INCT-CA surgiu em 2008, ainda com o nome de Instituto Brasileiro de Ciência Animal. Segundo seu coordenador, Sebastião de Campos Valadares Filho, pesquisador da área de Nutrição e Alimentação Animal, o INCT-CA garantiu uma oportunidade para a estruturação do grupo de trabalho que já existia entre pesquisadores do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e instituições distribuídas em diferentes estados do Brasil como São Paulo, Bahia e Pernambuco.  

Nutrição Animal 

Atualmente, o INCT-CA tem, aproximadamente, 86 pesquisadores que pertencem a 26 instituições distribuídas entre 12 estados brasileiros, a maioria deles no estado de Minas Gerais. As atividades de pesquisa são desenvolvidas em sete redes: Desenvolvimento, otimização e normatização de métodos para avaliação de alimentos e desempenho animal; Avaliação de exigências nutricionais de animais de produção; Biologia muscular e qualidade de carne em sistemas tropicais; Avaliação e redução do impacto ambiental pela atividade pecuária nos trópicos; Estudos sobre microbiologia zootécnica; Avaliação de Alimentos funcionais e aditivos melhoradores de desempenho animal e Avaliação e seleção de bovinos leiteiros nos trópicos. 

Sebastião está à frente da linha de pesquisa que avalia as exigências nutricionais de animais de produção, sendo eles: bovinos de corte e de leite e caprinos e ovinos. As pesquisas em nutrição animal desenvolvidas pelo INCT-CA resultaram nos sistemas nutricionais brasileiros que orientam as dietas que visam à otimização da produção aumentando o peso, a produção de leite, no caso de bovinos, enquanto reduz a quantidade de nutrientes consumidos. As pesquisas visam também refrear o impacto ambiental da produção, orientando dietas que podem reduzir o nível de poluentes excretados pelos animais na atmosfera. 

Em cada fase da vida, peso e objetivo da produção do gado, por exemplo, são necessárias diferentes exigências de nutrientes, especialmente proteínas na alimentação. Segundo Sebastião, as pesquisas no INCT-CA registraram, entre 2016 e 2023, uma redução de 5% desse valor. Isso representa uma economia milionária anualmente. “No Brasil, onde são abatidos aproximadamente 40 milhões de bovinos por ano, isso resulta em uma economia anual de aproximadamente R$130 milhões, considerando somente os seis milhões de animais confinados abatidos”, explica.

Além da economia, o INCT-CA preocupa-se com o impacto ambiental da produção de gado de corte. O grupo integra um projeto que reúne pesquisadores de cada um dos continentes. Em 2019, publicaram um artigo em colaboração na revista Agriculture, Ecosystems and Environment. O estudo investigou a produção de metano entérico, produzido durante o processo de digestão de bovinos de corte, utilizando dados de diferentes regiões do mundo. O objetivo foi modelar e prever a produção, rendimento e intensidade do metano, considerando fatores como região geográfica e tipo de dieta. 

BR-CORTE 

Antes da estruturação do INCT-CA, o grupo de pesquisadores já trabalhava no desenvolvimento de um sistema de nutrição com aplicação teórico-prática. O primeiro sistema nutricional capaz de calcular as necessidades nutricionais do gado zebuíno típico do Brasil - o BR-CORTE. Desde então, foram diversas publicações feiras nos anos de 2006, 2010, 2016 e 2023, reunindo os resultados de anos de avaliação de pesquisas de padrões nutricionais que norteiam pesquisadores e produtores de todo país. 


Sebastião de Campos Valadares Filho segurando 4a edição do BR-CORTE, um dos sistemas nutricionais desenvolvidos pelo INCT- CA Foto: Júlia Rodrigues/FAPEMIG ACS

O BR-CORTE foi transformado em um software online destinado ao produtor. Disponível também nas versões IOS e Android para celular, orienta sobre a quantidade de nutrientes que o animal precisa ingerir para alcançar um determinado nível de produção. Em 2020, foi feito um acordo de parceria com uma empresa privada que mantém e atualiza o software. São mais de 560 mil dietas formuladas, um total de 26,5 mil usuários cadastrados, estando presente em mais de 63 países em versão em português e inglês. 

Perspectivas Futuras 

Para Sebastião, o INCT é um processo dinâmico, ressaltando que a cada edição os projetos se renovam com novos objetivos. Ele conta que o instituto tem modernizado métodos alternativos a partir do uso de inteligência artificial (IA). Atualmente a nova rede Tipificação de carcaça e qualidade da carne, coordenada pelo pesquisador Mário Chizzoti (UFV), tem utilizado IA, além de ultrassonografia, termografia e imagens em 2D e 3D, para avaliar o quanto os animais tem aproveitado da alimentação. 

Uma das ferramentas utilizadas é a Dexa, do inglês, Dual-Energy X-ray Absorptiometr que prediz o rendimento e a qualidade da carne, informando a proporção de carne magra, gordura e osso na carcaça. O sistema permite estimar a quantidade de proteína da carne de forma indireta, sem que seja necessário sacrificar o animal reduzindo custos e otimizando a produção de dados que integrarão os futuros sistemas nutricionais. 


Maria Rogervânia Silva de Farias (UFV) ao lado do DEXA utilizado na tipificação de carne. Foto: Júlia Rodrigues/ACS FAPEMIG 

Programa INCTs 

O edital contava com recursos de uma parceria firmada entre a FAPEMIG, o Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI à época, o MCT); o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp)

O programa Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT), que conta hoje com cerca de 202 institutos, foi criado com objetivo de formar redes multi-institucionais e interdisciplinares dedicadas à investigação científica em temáticas estratégicas e enfrentamento aos grandes desafios nacionais, substituindo o Programa Institutos do Milênio do CNPq. A Instituição sede deveria ser caracterizada pela excelência em produção científica e/ou tecnológica, alta qualificação na formação de recursos humanos, presença de redes científico-tecnológicas e a capacidade de alavancar recursos de outras fontes.