Desafio da inclusão em processos de contratação

Luana Cruz / Minas Faz Ciência - 02-03-2020
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Há quase 30 anos, as empresas no Brasil são obrigadas – pela Lei 8213/91, conhecida como Lei de Cotas para Pessoas com Deficiência – a praticar inclusão em processos de seleção para oportunidades de emprego. Muitas, entendem-se forçadas a preencher percentuais determinados de vagas, outras, compreenderam a importância da diversidade para o ambiente corporativo.

Foi nesse cenário que a psicóloga Emmanuelle Fernandes enxergou a oportunidade de inovar, criando uma startup de contratação profissional inclusiva. Trabalhando na área de Recursos Humanos e Recrutamento, ela foi confrontada pelo desafio da inclusão.

“Em 2014, trabalhava no RH de uma mineradora de grande porte. Surgiu uma fiscalização do Ministério do Trabalho para cumprimento da Lei de Cotas e a empresa teve uma autuação porque não cumpria a regra”, conta. Assim, foi necessário recrutar pessoas com deficiência, processo do qual Emmanuelle Fernandes participou ativamente.

Desde então, o olhar dela mudou. “Percebi que o processo de seleção e integração da pessoa com deficiência era muito defasado. Faltava uma ferramenta para olhar o real potencial dessas pessoas”, explica. Ela relata o caso de uma candidata com Síndrome de Down que foi trabalhar no próprio setor de RH e ficou responsável pela área administrativa.

“Notei que ela tinha dificuldade com atividades de Excel, números e concentração. Por outro lado, era extrovertida e gostava de se comunicar. As dificuldades dela eram associadas à deficiência de forma errada”. Para Emmanuelle Fernandes, naquele caso, o processo seletivo não permitiu avaliar o perfil, e posteriormente, dar o mérito à funcionária por ser uma pessoa comunicativa.

Ideias e encontros

Emmanuelle Fernandes foi em busca de ferramentas no mercado para avaliar cognição, um processo que faz cada um perceber as informações de maneira única. Ela entendeu que a cognição era a chave para equidade e não encontrou ferramentas que conseguisse usar para processos de seleção de pessoas com deficiência. Partiu, então, para a jornada de criar a própria ferramenta.

Dessa forma, elaborou um projeto inicial em 2014, reescreveu em 2016 e decidiu colocar em prática. Largou a carreira de RH e foi empreender. No final de 2017, conseguiu o aporte de sócios investidores que acreditaram na ideia e ajudaram a formular um negócio escalável. “Além de usar neuropsicologia, era necessário agregar tecnologia para permitir uma escala maior de atendimentos em processos de recrutamento”, explica.

Em 2018, palestrou na PUC Minas sobre as questões relacionadas à avaliação de pessoas com deficiência por meio de cognição. Ali, conheceu sua atual sócia, Patrícia Cardoso, que na época desenvolvia um trabalho com objetivo similar da inclusão. As duas se juntaram para formular o que hoje é a Avulta.

O negócio

Atualmente, a Avulta usa anamnese online, que é uma entrevista preparada por profissionais de saúde. “Os candidatos preenchem e usam o campo de redação para escrever. A gente faz avaliações com técnicas da neuropsicologia e já tem um subsídio para apontar a indicação profissional de acordo com o que apresentou de viés cognitivo”. Mas a Avulta já desenvolveu outra ferramenta para recrutamento e que está sob validação junto ao Conselho de Psicologia.

Assim, a startup conecta candidatos a empresas e vice-versa. Em 2019, conseguiu colocar cerca de 250 pessoas no mercado e, este ano, já fechou contratos com grandes organizações. “As empresas querem cumprir as metas de cotas, mas também acreditam na inclusão que a Avulta promove. Querem diversificar o ambiente como um todo”, afirma.

Emmanuelle Fernandes conta que uma grande empresa do setor automobilístico procurou a Avulta ano passado para ajudar a cumprir a cota de pessoas com deficiência na área operacional. A startup apresentou perspectivas de inclusão, que vão além da lei, e naquele momento não houve negócio.

Este ano, a empresa voltou a procurar os serviços, mas com mentalidade modificada e querendo fazer contratações para média e alta liderança. “Querem que a inclusão seja algo inspirador e que todos possam viver a diversidade”.

Texto publicado originalmente no site Minas Faz Ciência. Para ler mais matérias como essa acesse aqui.